Por Pero de Magalhães Gândavo (1576)
E assim uma das Capitanias que agora está mais povoada de Portugueses de quantas ha nesta Província, é esta da Bahia de Todos os Santos. Tem três povoações mui nobres e de muitos vizinhos, as quais estão distantes das de Paranãobuco cem léguas, em altura de treze grãos.
A principal onde residem os do governo da terra e a mais da gente nobre, é a cidade do Salvador. Outra está junto da barra, a qual chamam Vila Velha, que foi a primeira povoação que ouve nesta Capitania. Depois Thomé de Sousa sendo Governador edificou a Cidade do Salvador mais adiante meia légua por ser julgar mais decente e proveitoso para os moradores da terra. Quatro léguas pela terra dentro está outra que se chama Paripe que tão bem tem jurisdição sobre si como cada uma das outras. Todas estas Povoações estão situadas ao longo de uma baia mui grande e fermosa, onde podem entrar seguramente quaisquer nãos por grandes que sejam: a qual é três léguas de largo, e navega-se quinze por ela dentro. Tem dentro em si muitas ilhas de terras mui singulares. Divide-se em muitas partes, e tem muitos braços e enseadas por onde os moradores se servem em barcos para suas fazendas.
A quarta Capitania que é a dos Ilhéus se deu a Jorge de Figueiredo Correa, Fidalgo da Casa de El Rey nosso Senhor: e por seu mandado a foi povoar um João D'almeida, o qual edificou sua povoação trinta léguas da Bahia de Todos os Santos em altura de quatorze grãos e dous terços. Esta povoação é uma Vila mui fermosa, e de muitos vizinhos, a qual está em cima de uma ladeira á vista do mar, situada ao longo de um rio onde entram os navios. Este rio tão bem se divide pela terra dentro em muitas partes, junto do qual tem os moradores da terra toda a granjeira de suas fazendas: para as quais se servem por ele em barcos e almadias como os da Bahia de Todos os Santos.
A quinta Capitania a que chamam Porto Seguro conquistou Pero do Campo Tourinho: tem duas povoações que estão distantes das dos Ilhéus trinta léguas em altura de dezesseis grãos e meio: entre as quais se mete um rio que faz um arrecife na boca como enseada, onde os navios entram. A principal povoação está situada em dous lugares, convém a saber parte dela em um teso soberbo que fica sobre o rolo do mar da banda do Norte, e parte em uma várzea que fica pegada com o rio. A outra povoação a que chamam Santo Amaro está uma légua deste rio para o Sul. Duas léguas deste mesmo arrecife, para o Norte está outra que é o porto, onde entrou a frota quando esta Província se descobriu. E porque então lhe foi posto este nome de Porto Seguro, como atras deixo declarado, ficou daí a Capitania com o mesmo nome: e por isso se diz Porto Seguro.
A sexta Capitania é a do Espirito Santo, a qual conquistou Vasco Fernandes Coutinho. Sua povoação está situada em uma Ilha pequena, que fica distante das povoações de Porto Seguro sessenta léguas em altura de vinte grãos. Esta ilha jáz dentro de um rio mui grande, de cuja barra dista uma légua pelo sertão dentro: no qual se mata infinito peixe e pelo conseguinte na terra infinita caça, de que os moradores continuamente são mui abastados. E assim é esta a mais fértil Capitania e melhor provida de todos os mantimentos da terra que outra alguma que haja na costa.
A sétima Capitania é a do Rio de Janeiro: a qual conquistou Men de Sà, e á força d’armas, oferecido a mui perigosos combates a livrou dos Franceses que a ocupavam, sendo Governador geral destas partes. Tem uma povoação, a que chamam São Sebastião, Cidade mui nobre e povoada de muitos vizinhos, a qual está distante da do Espirito Santo setenta e cinco léguas em altura de vinte e três grãos. Esta povoação está junto da barra, edificada ao longo de um braço de mar: o qual entra sete léguas pela terra dentro, e tem cinco de travessa na parte mais larga, e na boca onde é mais estreito haverá um terço de légua. No meio desta barra está uma Légua que tem cinquenta e seis braças de comprido, e vinte e seis de largo: na qual se pode fazer uma fortaleza para defensão da terra, se cumprir. Esta é uma das mais seguras e melhores barras que ha nestas partes, pela qual podem quaisquer nãos entrar e sair a todo o tempo sem temor de nenhum perigo. E assim as terras que ha nesta Capitania, tão bem são as melhores e mais aparelhadas para enriquecerem os moradores de todas quantas ha nesta Província: e os que la forem viver com esta esperança, não creio que se acharão enganados.
(continua...)
GÂNDAVO, Pero de Magalhães. História da Província Santa Cruz, a que vulgarmente chamamos Brasil. Lisboa: Oficina de António Gonçalves, 1576. Disponível em domínio público em: https://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=17411. Acesso em: 26 nov. 2025.